Desenvolvendo ferramentas para pesquisadores da Comunicação
Um relato de pesquisa aplicada por um jornalista que se atreveu a estudar programação e pensar como cientista de dados.
A principal característica da pesquisa aplicada é sua orientação para solucionar problemas reais. Simples assim.
Não basta o pesquisador gostar do tema, é preciso que aquele tópico sobre o qual vai se debruçar esteja incomodando alguém para que o esforço da pesquisa possa, se bem sucedida, agregar melhorias a produtos, processos ou até criar algo totalmente novo. Mesmo quando não dá certo, a pesquisa aplicada mapeia caminhos para que outros, posteriormente, possam economizar tempo e esforços, aprendendo com as dificuldades encontradas no percurso feito anteriormente. Assim segue a ciência.
Olhando especificamente para a área de Comunicação e Informação são grandes os desafios que estão propostos aos pesquisadores. No documento de área da CAPES, encontramos considerações gerais sobre tendências e o estado da arte do nosso campo de conhecimento. Num resumo, destacamos:
- Centralidade da Comunicação na Sociedade Contemporânea
- Volume de Dados no Ambiente Digital Gerando Novos Desafios de Pesquisa
- Transformações Tecnológicas , Sociais e Econômicas
- Interdisciplinaridade — “No âmbito dos programas é fundamental fomentar e implementar ações voltadas ao diálogo com outros campos científicos…”
- Necessidade de orientação à inovação e à criatividade
- Inclusão de temas como Big Data entre as novas fronteiras de pesquisa, incluindo grandes volumes de dados, visualização, métricas e ciência de dados
Há algum tempo tenho escrito sobre a necessidade de reconfigurar métodos e ferramentas de pesquisa para podermos encarar a situação que (diferente do que tínhamos antes), em muitos casos, não é de escassez de dados, mas sim de excesso, em condições de volume, variedade e velocidade totalmente inéditas.
No LABCOM — Laboratório de Convergência de Mídias trabalhamos no sentido de integrar desenvolvimento teórico e aplicado, sempre que possível, convertendo conhecimento e experiência em artefatos tangíveis, que possam ser testados e utilizados, mesmo que em caráter restrito, de forma a retroalimentar o eterno ciclo de aperfeiçoamento e aprofundamento, inerente ao fazer científico.
Hoje atuamos em duas linhas básicas.
A primeira, de caráter bem mais específico, explora o potencial de utilização de tecnologias emergentes como realidade aumentada, realidade virtual, internet das coisas, big data e inteligência artificial no processo de produção de conteúdo jornalístico. O projeto Jumper, um ambiente de consumo de notícias em realidade virtual e o desenvolvimento de AVIs, agentes virtuais de informação, são exemplos desta linha.
Já a segunda linha, de caráter mais geral, é focada no trabalho de popularização da abordagem dos Métodos Digitais no Brasil, caminho orientado ao tratamento de entes do ecossistema informacional contemporâneo que tem origem essencialmente binária, com especificidades, muitas vezes difíceis de apreender utilizando as tradicionais ferramentas de descrição e interpretação tão comuns na nossa área.
Com desenvolvimento iniciado em 2018, a partir da nossa curiosidade anterior em estudar a linguagem de programação Python, em 2019 foram lançadas as 3 ferramentas iniciais pensadas especificamente para ajudar os pesquisadores, do Jornalismo e da Comunicação em geral, a coletar, processar e analisar, através de visualizações, volumes de dados disponíveis nos portais de conteúdo jornalístico (LNEWS) e na plataforma Twitter (LTWEET), hoje atraindo muito interesse dos pesquisadores como repositório digital da diversa produção de sentido humana.
Acessoriamente criamos também o LTEXTO , pequena ferramenta para gerar análises simples e gerar visualizações.
Em 2019 fizemos apresentações, principalmente da LNEWS em eventos como Intercom Nordeste , ABCiber e oficina no Intercom Nacional de Belém.
Recentemente, divulgamos mais duas ferramentas ligadas ao trabalho, vamos dizer assim, administrativo dos pesquisadores, que inclui, por exemplo, avaliar o Qualis Periódico de determinada revista para fins de publicação, ou ainda, gerar relatórios de sua produção, num processo de progressão de carreira ou, regularmente, nos ciclos de coleta da plataforma SUCUPIRA, no caso dos professores ligados à pós-graduação.
A LQUALIS faz consultas sobre a avaliação Qualis dos periódicos de Comunicação e Informação com a vantagem de trazer a pontuação simulada na tabela antiga e na nova(na data em que escrevo esse texto, ainda não oficial). Além disso a LQUALIS, permite consulta em lotes, ou seja, ao pesquisar por nome, posso solicitar a avaliação de várias publicações ao mesmo tempo.
Esta última função da LQUALIS é um bom exemplo de que o desenvolvimento aplicado não precisa ser sempre focado na criação de artefatos totalmente novos, o que chamamos de inovação disruptiva. Pelo contrário, as inovações incrementais, responsáveis por pequenas melhorias sobre o que já existe, são as mais comuns. A funcionalidade de consulta em lote (por enquanto) não existe na busca tradicional no portal da CAPES.
A ferramenta mais recente do LABCOM, a LCLattes, faz algo ainda mais simples: extrai dados do Lattes e gera relatórios com todas as informações contidas nesta base a partir de cada registro de produção acadêmica em artigos, trabalhos em eventos, livros e capítulos de livro, por enquanto.
A motivação de desenvolvê-la foi porque sempre achei massante a tarefa de preencher uma ficha no Word, apenas transcrevendo esses dados, para encaminhamento aos coordenadores dos programas na época de coleta da plataforma SUCUPIRA. Aparentemente o problema que me incomodava, também era de outros pesquisadores.
Lançada no dia 15 de abril e divulgada pelos canais de comunicação do LABCOM o vídeo tutorial para utilização teve mais de 150 visualizações nas primeiras 24 horas. O site do laboratório também apresentou volume de tráfego bem acima da média, inclusive com acessos originados em outros países.
Se os números parecem pequenos diante dos milhares e milhões ostentados pelos grandes influenciadores digitais, no meio científico, no trato de temas muito específicos, tais indicadores são expressivos, demonstrando não só que o problema existia, mas que o interesse por soluções para enfrentá-lo também. As ferramentas, definitivamente, não são perfeitas, mas é o caminho percorrido que tem valor inestimável, não só pela possibilidade de ajudar o outro, como também pelo autoaprendizado e pelo impacto social, através do uso e adoção, que, eventualmente, elas podem causar.
Esse é o caminho que seguimos.
Abaixo segue um resumo com os links para cada uma.
LNEWS — ferramenta de coleta de conteúdo em sites jornalísticos. Extrai textos, links e títulos das matérias filtradas por editoria ou palavra-chave.
LTWEET — ferramenta de coleta de tweets que podem ser filtrados por usuário ou palavra-chave.
Link de acesso para ambas: https://www.labcomdata.com.br/teste . Observação: é necessário cadastrar o pesquisador em formulário na home do site e depois solicitar acesso de membro já que o acesso é feito logado no site.
LTEXTO — Faz análise de arquivos de texto gerando visualização de palavras frequentes e dispersão léxica. Ainda em desenvolvimento. Utilização mediante solicitação de link.
LQUALIS — Verifica o QUALIS Periódicos de publicações da área de Comunicação e Informação oferecendo a pontuação nas tabelas antiga e nova(ainda não oficial) e consulta em lote.
Link de acesso: https://www.labcomdata.com.br/code
LCLATTES — Gera relatórios detalhados sobre a produção dos pesquisadores com base nos dados do CNPq. Inclui hoje a produção acadêmica em revistas, trabalhos em eventos, livros e capítulos.
Link de acesso: https://www.labcomdata.com.br/coleta-lattes
Vídeos Tutoriais para as ferramentas são encontrados no canal do LABCOM no YOUTUBE em https://www.youtube.com/channel/UCz9xhatSPQ9MZFPf1e9kDUQ/videos
Para quem não conhece o meu trabalho, há 10 anos coordeno o LABCOM -Laboratório de Convergência de Mídias onde desenvolvemos projetos na fronteira entre a comunicação e a tecnologia, num esforço interdisciplinar de diálogo com outras áreas de conhecimento como o Design, a Computação e a Ciência de Dados. Antes de entrar na universidade passei cerca de 20 anos atuando como profissional independente, tendo meu próprio negócio na área do audiovisual e oferecendo consultoria para outros. Hoje, na UFMA e no campo da Comunicação, desenvolvo pesquisa aplicada em projetos orientados à utilização de tecnologias emergentes no processo de produção do jornalismo e na difusão dos Métodos Digitais e da Design Science no meio acadêmico nacional.
